Sem palavras...
Acampamento na beira da estrada no município de Itararé/SP |
"O perído atual, porém, não é de conservação, é de reforma, tão extensa, tão larga e tão profunda que se possa chamar revolução; de uma reforma que tire esse povo do subterrâneo escuro da escravidão onde ele viveu sempre, e lhe faça ver a luz do século XIX. Sabeis que reforma é essa? É preciso dizê-lo com a maior franqueza: é uma lei de abolição que seja também uma lei agrária.
Não sei se todos me compreendeis e se avaliais até onde avanço neste momento levantando pela primeira vez a bandeira de uma lei agrária, a bandeira da constituição da democracia rural, esse sonho de um grande coração, como não o tem maior o abolicionismo, esse profético sonho de André Rebouças.
Pois bem, senhores, não há outra solução possível para o mal crônico e profundo do povo senão uma lei agrária que estabeleça a pequena propriedade, e que vos abra um futuro, a vós e vossos filhos, pela posse e pelo cultivo da terra. Essa congestão de famílias pobres, essa extensão de miséria - porque o povo de certos bairros desta capital não vive na pobreza, vive na miséria -, esses abismos de sofrimento não têm outro remédio senão a organização da propriedade da pequena lavoura. É preciso que os brasileiros possam ser proprietários de terra e que o Estado os ajude a sê-lo. Não há empregos públicos que bastem às necessidades de uma população inteira. É desmoralizar o operário acenar-lhe com uma existência de empregado público, porque é prometer-lhe o que não se lhe pode dar e desabituá-lo do trabalho que é a lei da vida.
O que pode salvar a nossa pobreza não é o emprego público, é o cultivo da terra, é a posse da terra que o Estado deve facilitar aos que quiserem adquiri-la, por meio de um imposto - o imposto territorial. É desse imposto que nós precisamos principalmente, e não de impostos de consumo que vos condenam à fome, que recaem sobre as necessidade da vida e sobre o lar doméstico da pobreza. [...] É tempo de cessar esse duplo escândulo de um país nas mãos de alguns proprietários que nem cultivam suas terras, nem consentem que outros as cultivem, que esterilizam e inutilizam a extensão e a fertilidade do nosso território; e de uma população inteira reduzida à falta de independência que vemos. Se eu não estivesse convecido de que uma lei agrária prudente e sábia podia criar um futuro aos brasileiros privados de trabalho, teria que aconselhar-lhes que emigrassem, porque a existência que levam não é digna de homens que se sentem válidos e querem dar a seus filhos uma educação que os torne independentes e lhes prepare uma condição melhor do que a da presente geração."
Discurso de Joaquim Nabuco em São José - Praça de São José de Riba-Mar, 5 de novembro de 1884.
Ocupação Itararé/SP |
Nenhum comentário:
Postar um comentário
"no artigo 5º, inciso IV da Carta da República: 'é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato'."