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"Harmonizo meus pensamentos para criar com a visão". "Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e não mais lutando por dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a um novo nível".

sexta-feira, 13 de março de 2015

Mutirão

Desenho ilustrativo do livro de Clóvis Caldeira, Mutirão, 'Formas de Ajuda Mútua no Meio Rural,' São Paulo. 1957, Companhia Editora Nacional

"Mutirão! Só esta palavra nos faz ressoar aos ouvidos os alegres rumores dos descantos e folguedos da roça, o estrépito dos sapateados da dança camponesa por entre a zoada dos adufes e violas, e nos transporta ao meio das rústicas e singelas cenas de prazer da vida do sertanejo"
Guimarães (1995, p. 51), em O Seminarista.

No Brasil todo vem acontecendo o resgate do mutirão. Essa importante manifestação cultural, sempre esteve viva em muitas comunidades rurais em nosso país. Atualmente podemos vivencia-lo nos novos grupos de produtores e produtoras, principalmente os assentados da reforma agrária, como também entre muitos jovens universitários, reunidos em grupos agroecológicos, grupos de permacultura, grupos periurbanos e urbanos. Enfim, os mutirões: agroflorestais, de bioconstruções, de plantios de jardins comestíveis em praça pública e outros, é o futuro. E, 'felizes os que forem chamados a participar, como soldado do trabalho, na construção do novo mundo'.

Vamos a algumas definições sobre o MUTIRÃO..

Nome genérico por que é conhecido o trabalho cooperativo entre populações rurais. Há outras denominações regionais, mas tende a generalizar-se a de mutirão, de origem tupi. 

Derivação do costume rural, é vaca, vaquinha, para aluguel de carro nas cidades, com igual contribuições dos interessados. 

O mutirão compreende determinados trabalhos: broca de roçados, capina de plantações, cava de leirões, reparos em paredões de açudes, cobertura de casas de palha, transporte de maneira pesada, canoas, etc. 

Por ampliação, pode abranger igualmente algumas formas de parceria no trabalho agrário. O mutirão é uma instituição social que atenua, corrigindo-os, os efeitos individualistas que a economia latifundiária imprimiu à vida rural brasileira. O dono do serviço anuncia a sua intenção de realizar um mutirão. Convida os vizinhos, que acodem pressurosos. No dia designado, manhã cedo, chegam os trabalhadores munidos dos instrumentos necessários: foices, enxadas, machados, cordas.

Concentração de amigos para o mutirão da RAE

De ordinário há um responsável pela direção dos trabalhos, o cabo, evidente reminiscência da época das bandeiras. O dono do serviço é considerado com honras excepcionais e, no regresso, à tarde, é conduzido de cadeirinha ou sobre os ombros de algum trabalhador. É indispensável a música. Na véspera uma animal doméstico é sacrificado. Aguardente em profusão. Á noite, no terreiro da casa, danças regionais.

Nas zonas de colonização alemã Ernst Wagemann e Emílio Villems encontraram o mutirão com a denominação de juntament, 'prova de que houve influência brasileiras sobre as formas do mutirão primitivo', como observa Willems, assinalando noutro passo que 'certas aplicações do mutirão entre os colonos não se conhecem na Alemanha', enquanto Wagemann acrescenta que o ajuntamento no Espírito Santo 'corresponde exatamente ao Bittarbeit'. 


"o mutirão é uma prática antiga realizada principalmente no meio rural. A autoconstrução, o mutirão, o adjunto, a troca de dias, a ajuda mútua são termos usados para designar um processo de trabalho calcado na cooperação entre as pessoas, na troca de favores, nos compromissos familiares, diferenciando-se, portanto, das relações capitalistas de compra e venda da força de trabalho. A essência do mutirão está na solidariedade entre as pessoas que se ajudam mutuamente. Há exemplo, temos as quebradeiras de coco do babaçu, o grupo social escolhido, que coletam os cocos das matas de Babaçu, os babaçuais, e levam para casa. Quando a quantidade de coco é grande, elas organizam mutirões, cada dia na casa de uma quebradeira, para agilizar o processo. Essa prática realizada por elas, poderia ser facilmente reconhecida como patrimônio cultural imaterial, levando em consideração o que a legislação, o IPHAN e a Unesco entendem por patrimônio imaterial. O reconhecimento desta prática se mostra importante, uma vez que o Patrimônio Imaterial é transmitido de geração em geração e constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana. Assim, os resultados obtidos nesta pesquisa, revelam a importância da tutela do patrimônio cultural, principalmente no que se refere aos grupos sociais portadores de identidade que ainda lutam pelo efetivo reconhecimento por parte do Estado brasileiro."


Há cantigas especialmente destinadas às festas do mutirão, que constituem mesmo um excelente espécime de canto coral, com duetos, tercetos e até quartetos. Também há versos improvisados, aludindo a incidentes jocosos ou cômicos. 

Existem mutirões femininos entre rendeiras e fiandeiras e para outros trabalhos executados por mulheres. O mutirão não é nem ameríndio nem afro-negro. É antes uma permanência cultural. Uma instituição social. Uma resultante do instinto gregário do homem.. Consequência da vida em sociedade. A unificação de esforços no sentido econômico. O povo une-se para enfrentar o trabalho, como se une para bater o inimigo comum às portas da cidade, ou para apagar o fogo na casa do vizinho. Apenas cada grupo social o organiza segundo seus hábitos ou tendências peculiares, em consonância com o ambiente. É uma instituição universal.


INCIDÊNCIA GEOGRÁFICA

ALEMANHA - Bittarbeit.
BORNÉU -  Hando, neweh.
BRASIL:
Amazonas - Aiuri, ajuriajuricaba, mutirum, potirum, puxirum;
Pará - Mutirão, mutiron, mutirum, putirão, putiron, putirum.
Maranhão - Estalada, mutirão, putirão.
Piauí - Adjutório.
Ceará - Adjunto, adjutório.
Rio Grande do Norte - Adjunto, ajuda, arrelia, faxina.
Paraíba - Arrelia, bandeira, batalhão.
Pernambuco - Adjunto, corte, pega-de-boi.
Alagoas - Adjunto.
Sergipe - Adjuntório, batalhão.
Bahia - Adjutório, batalhão, boi-de-cova.
Espírito Santo - Mutirão, putirão.
Rio de Janeiro - Mutirão, putirão.
São Paulo - Ajuda, muchirão, mutirão, puchirão, putirão.
Paraná - Mutirão, pixirum, puchirão, putirão.
Santa Catarina - Mutirão, pixirum.
Rio Grande do Sul - Adjutório, pixirum, puxirão, puxuru.
Minas Gerais - Batalhão, mutirão, muxirão, puxirão.
Goiás - Mutirão, suta, traição.
Mato Grosso - Mutirão, traição.
CANADÁ - Corvée.
CHILE - Minga, mingaco.
COLÔMBIA - Chagua, faena, gavilán, minga.
CUBA - Junta, cobija, guateque.
DAOMÉ - Dokpower.
EQUADOR - Fagina, minga.
FRANÇA - Filovas.
GUIANA HOLANDESA - Kweki.
JAPÃO - Yui, temegaeschi.
HAITI - Coumbite.
MÉXICO - Oaxaca: Faena, tequio, mudanza. Yucatán: Fagina.
PERU - Minga, mingaco.
PORTUGAL - Beira: Carreto. Minho: Bessada, esfolhada.
REPÚBLICA ARGENTINA: Minga, rodeo.
REPÚBLICA DOMINICANA - Timoun.

BIBLIOGRAFIA: Clóvis Caldeira, Mutirão, "Formas de Ajuda Mútuas no Meio Rural," São Paulo, 1957, Companhia Editora Nacional; Hélio Galvão, O Mutirão no Nordeste, Rio de Janeiro, 1959, Ministério da Agricultura, Serviço de Informação Agrícola - (Hélio Galvão, da Universidade do Rio Grande do Norte).

Fonte: Luiz da Câmara Cascudo, Dicionário do Folclore Brasileiro.   

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