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"Harmonizo meus pensamentos para criar com a visão". "Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e não mais lutando por dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a um novo nível".

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Repúdio à criação da ANATER

Dissidência ou a arte de dissidiar


Moção de repúdio ao processo de criação e concepção da ANATER

Desde 2003, com a posse do primeiro governo Lula, o Estado brasileiro vem tomando medidas concretas no sentido de revitalizar as ações públicas de Assistência Técnica e Extensão Rural. Uma das principais características desse processo de reconstrução da ATER pública foi a efetiva participação de movimentos sociais e demais organizações da sociedade civil nos processos de debate e elaboração das concepções e metodologias dos serviços de ATER. Dessa forma, foi construída a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural - PNATER e a lei de Ater.  

Mais recentemente, a Iª Conferência Nacional de Ater (CNATER), cujo processo preparatório mobilizou 40 mil pessoas de todos os estados da federação, reafirmou a necessidade de criação de um Sistema Nacional para articular os serviços de Ater de forma pública e universal, voltado exclusivamente para agricultura familiar e fundamentada nos princípios da Agroecologia.

Em todo o Brasil, testemunhamos que esta experiência de ATER com enfoque agroecológico já deu passos significativos, inclusive com o reconhecimento do MDA em suas publicações intituladas “Práticas de Excelência em ATER”. Essas experiências ensinam que a construção da agroecologia não se faz com base nos preceitos do difusionismo tecnológico e sim no protagonismo dos agricultores familiares em dinâmicas locais de inovação, mediante o dialogo de saberes científicos e populares.

Diante dessa evolução positiva que vem cobrando muito esforço das organizações da sociedade e do governo federal, fomos surpreendidos com o anúncio intempestivo da proposta de criação de uma Agência Nacional de ATER (ANATER), cuja formulação já se encontra no formato de um Projeto de Lei em estado avançado de debate no Congresso Nacional. A exposição de motivos que acompanha o referido PL não deixa dúvidas com relação à intenção do governo de reafirmar a perspectiva difusionista, ao atribuir centralidade do sistema de ATER à Embrapa, sob a alegação de que as tecnologias já desenvolvidas pelo Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuário (SNPA) não são acessadas pelos agricultores.

Questionamos radicalmente essa interpretação que fundamenta a criação da ANATER. Em primeiro lugar, porque a maior parte do acervo tecnológico desenvolvido pelo SNPA não se ajusta à realidade da agricultura familiar e povos e comunidades tradicionais por induzi-los a crescente dependência ao sistema financeiro e agroindustrial. Tanto isso é verdade que a parcela da agricultura familiar que vem incorporando as referidas tecnologias da modernização com apoio das políticas do Estado estão cada vez mais dependentes do financiamento público para reproduzirem seus sistemas de produção. O expressivo aumento dos índices de endividamento da agricultura familiar nos últimos anos é uma expressão inequívoca desse fenômeno.

Em segundo lugar, porque a perspectiva agroecológica não se coaduna com a intenção de disseminação universal de tecnologias geradas em meio controlado nos centros de pesquisa. No lugar do fortalecimento de um sistema público de ATER que reforce essa perspectiva difusionista, temos lutado e permaneceremos lutando pelo desenvolvimento de abordagens para construção do conhecimento fundamentadas na ação protagonista das comunidades rurais em parceria com extensionistas e pesquisadores. Isso implica não só a continuidade da renovação do sistema de ATER em sintonia com as proposições da I CNATER como a reformulação do sistema de pesquisa agropecuária, com a revisão das abordagens metodológicas e do enfoque adotado pela Embrapa, pelas OEPAs e pelas universidades brasileiras em coerência com os princípios agroecológicos.

Diante desse conjunto de questões, nós, 2300 participantes do III Encontro Internacional de Agroecologia (III EIA) que reuniu agricultores/as familiares, assentados/as, extensionistas, pesquisadores/as, estudantes, gestores públicos e professores nos colocamos radicalmente contra o movimento em curso que sinaliza uma clara desconstrução dos acúmulos duramente conquistados nos últimos anos no campo da ATER pública para a agricultura familiar, e para isso, propomos a abertura de um amplo debate público a respeito da ANATER.

Botucatu, 03 de agosto 2013.



Fonte: Blog do III Encontro Internacional de Agroecologia

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