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"Harmonizo meus pensamentos para criar com a visão". "Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e não mais lutando por dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a um novo nível".

sábado, 25 de junho de 2016

Je suis Oaxaca

e, resumo do I Seminário Internacional sobre Educação do Campo

por Tião Pinheiro (Juquira Candiru Satiagraha)

Cambada (não se ofendam, essa palavra do Quimbundo significa “grupo de camaradas em ação”) estou de volta do I Seminário Internacional sobre Educação do Campo organizado pela FACED da U. F. de Uberlândia e muitíssimo mais enfezado (infenso) pelo massacre de professores em Oaxaca a maior universidade a céu aberto do Planeta. Uma estudante yankee estudante no M.I.T me disse: “Seis meses nessas montanhas com esses povos se aprende mais que em cinco anos na minha instituição. Não entendi por que ela disse povos no plural, mas depois conheci Monte Alban, S. Juan Tabá, Gelatao em várias viagens a Oaxaca, e então, entendi.
No III Fórum Social Mundial de Porto Alegre assisti uma oficina organizada por gente da Bunge, que pôs à mesa 10 ambientalistas famosos para falar sobre o meio ambiente para respaldar sua ação destruidora social e ambiental no sul do Piauí. Fiz eles engolirem tudo que tinham dito. Eu estava tão revoltado que ao voltar para o meu lugar cruzei olhar com um participante vestindo huipil (A. Gonzalez). Perguntei: Sos mexicano? Ele assentiu com a cabeça e eu ampliei: De donde? - Ele disse de Oaxaca. Eu disse: Sos feliz, pues Dios hizo Oaxaca y el diablo hizo el resto del mundo, de donde viven esos. Ele apenas balançou a cabeça. Um massacre de professores no país que em 1936 deu exemplo ao mundo recebendo milhares de crianças refugiadas da Guerra Civil Española e foram hospedadas no Palácio Presidencial em Los Pinos para a perplexidade do Mundo. A Inglaterra foge da União por temer refugiados e esse massacre nivela governos, mas jamais nivelará povos. O triste é que não vemos uma campanha orquestrada “Je suis Oaxaca”. Mundo estranho.
No avião retornando de Uberlândia comecei a escrever as experiências, emoções e situações no Seminário. Veio a lembrança do ocorrido na comunidade de Rincón-í, no Paraguai onde um genocídio foi perpetrado pela Delta Pine através de um agrônomo norte-americano. Eles venderam sementes de algodão sem poder germinativo para agricultores paraguaios plantarem em uma falcatrua milionária ganhando nas duas pontas, pois as sementes tratadas com 5 agrotóxicos e uma bactéria Bacillus subtilis patenteada (OGM?) para sua disposição legal nos EUA custaria alguns milhares de dólares.
Os agricultores indignados devolveram as sementes e a empresa transportou 17 cargas de caminhões grandes para depositar as sementes envenenadas, clandestinamente em um terreno baldio perto de uma escola onde estudavam 276 crianças. Fui chamado a ajudar no problema, mas cheguei à Rincón-í com dor de garganta pelo frio do avião e sai cedo para procurar folhas de tansagem (Plantago major). Estava eu prospectando umas macegas e um menino paraguaio com fortes traços do povo guarani se aproximou e perguntou qual era minha preocupação. Foi obrigado a repetir em espanhol para receber a minha resposta: Yo necesito una ojita de llantén (tansagem) para mi garganta.
Ele riu e disse: Tansagem não nasce em solo argiloso como esse, ele gosta de terra arenosa. Ele rapidamente procurou na macega e trouxe uma planta parecida a uma malva e disse pode mastigar essa e deixar junto à gengiva faz o mesmo efeito.
Atônito eu perguntei a ele como é que você sabe isso. Ele riu e respondeu: Que eu saiba não é estranho, mas que você não saiba isto sim é muito estranho, e riu...
Com essas lembranças e referencias posso situar o que significou o Seminário em Uberlândia, mas antes de chegar a ele é preciso ressaltar 3 elementos fundamentais:
- A Ousadia de organizá-lo no coração do Portal do Cerrado onde há mais de 35 anos está montado o maior laboratório de tecnologias para o Bioma que estranhamente não consta da Constituição Nacional, embora isso tenha outro significado que o de esquecimento ou ignorância. Laboratório, pois ele não visa atender aquele Bioma, mas poder aprender nele o que vai se multiplicar na Savana Africana, seu homônimo vinte vezes maior, na Revolução Verde de matriz Biotecnológica onde tem interesses Bill Gates e trabalha Kofi Anan.
A mesa de abertura foi tão ampla que coube a representação de todos os movimentos humanos ultrassociais, ou seja, aqueles encarregados de alimentar ou proteger a natureza e a carga de sentimentos e emoções das falas iniciais marcou o segundo elemento: - O Medo-desespero que ameaça agora mais que antes suas existências. O terceiro elemento foi à voz de cada movimento sem acesso à educação ou com ela negligenciado pelo Estado e Governos: Povos Indígenas, Povo Negro - Quilombola e os Sem Terra e outros que formam o Brasil.

Reforço isso, pois nos meios de comunicação diuturnamente anuncia-se que os agronegócios são o responsável pela alimentação da população do planeta. Ignoram que do total de natureza do Planeta somente 13% é aproveitável, onde a posse da terra está de 60 a 70% nas mãos da indústria de alimentos através dos agronegócios e alimenta apenas menos de 40% da população do Globo.

Os camponeses do mundo, segundo o ETC e GRAIN, ocupam de 30 a 35% das terras mas alimentam mais de 40% daquela população. É óbvio que governos e economias periféricas são impedidas de medidas para proteger seus camponeses e populações tradicionais com políticas públicas nacionais, a exemplo do que ocorre com os países centrais de economia hegemônica. Não interesse na produção camponesa, pois ela não permite a concentração e escala de commodities sem controle ou ingerências, também nas propinas e subornos por Coca Cola, Nestlé, Cargill, Bunge, Louis Dreyfuss etc., que pode ser encontrado no livro “A Máfia dos Alimentos” da Juquira Candiru.
As populações tradicionais trouxeram ao I Seminário Internacional de Educação do Campo algo mais que sua produção de qualidade superior. Trouxeram algo que jamais a indústria de alimentos e seu agronegócios vão construir: Cultura e Felicidade. Está foi a produção cientifica apresentada pelos estudantes, acadêmicos e professores ali presentes.
Um professor baiano da Licenciatura em Educação do Campo (música popular), da UF do Tocantis (campus Arraias) com sua harmônica de 8 baixos (gaita ponto do gaúcho), já praticamente extinta naquela região, nos trouxe algumas letras de Coco e Emboladas de letras capciosas e um cordel de rara beleza que já os jovens praticamente desconhecem pelo poder esterilizador dos meios de comunicação e mídia internacional. Ele chegou a formar uma “camerata” com o duo de chileno e gaúcho que com quenacho, charango, guitara e violão reviveram as canções nascidas das comunidades camponesas no que nós hoje denominamos Folclore, mas bem diferente do mesmo de interesse mercadológico das gravadoras e dos meios de comunicação e mídia encarregados da alienação cidadã, que não mais trazer a felicidade do canto na colheita, que significava fartura, felicidade e harmonia. Eles abriam e encerravam as jornadas do evento.

De certa feita, no México um camponês me disse: Antes, embora fossemos mais pobres, éramos muito mais alegres e felizes. Sim perdemos o valor das coisas pelo preço para conseguir o consumo e o choro substitui o canto e o que se expande é a pobreza, miséria e degradação cultural, ética e moral.

Eu não podia estar simultaneamente em todas as mesas que eram mais de 20, mas o que pude assistir é de registrar-se O desespero de Maximino um representante do Povo Kaiowá que nos trouxe o desespero da expansão dos agronegócios sobre suas terras e mostrou em vídeo um assassinato por jagunços onde a vítima baleada e indefesa foi junto com sua motocicleta atropelado por uma pá carregadeira e arremessado em uma vala para não existir sequer chance de atendimento. Seria muito propicio uma operação similar à “Lava a Jato” para as populações tradicionais.
A mesa do movimento indígena foi transbordante a educação para a vida. No Paraguai há a Associação de Professores e Maestros que tem o lema: “Quisiera vivir para estudiar y no estudiar para viver”. O estado de inversão de valores nos leva a Nietzsche na “Transvaloração de todos os Valores” e com isso se pode entender as colocações de Dr. (USP) Daniel Munduruku do povo Mundurucu o a Filosofa (UNESP) Cristine Katua do povo guarani e o oficial aviador da aeronáutica (RE) Marcos Terena do povo que lhe dá o sobrenome.

A Secretaria de Saúde do governo de Minas Gerais, uma negra nos trouxe em poucos vinte minutos uma viagem à condição do negro e sua expulsão do espaço público e privado no Brasil e suas conquistas a ferro e fogo dia a dia. Ela podia ser considerada o ponto alto, mas um jovem estudante moçambicano roubou à cena com seu depoimento humilde, humano e cósmico. Lembrei o amigo Lutzenberger (RIP) que ensinava: “Tião na África o nativo negro é o equivalente aos nossos povos indígenas, não há diferença”. Rimos juntos, quando a mulher Tuíra Kaiapó passou lentamente o facão na cara do burocrata não ameaçadora como a Globo forjou, mas com o sentido educativo que Maximino nos ensinou a todos (foto). Estou escrevendo agora e já sei sem aparecer na TV que o Professor Maximino carregou a Tocha Olímpica para o gáudio não só dos Kaiowas nesse momento de tanta tensão, desespero e dor.
Minha singela contribuição foi fazer durante minha apresentação um cromatograma de Pfeiffer com “Terra Preta de Índio”, o Solo mais fértil do mundo criado pela mão humana. Não estranhei quando ele se revelou em apenas vinte minutos depois da secagem, quando o normal são 4 dias. A Rede Globo em uma novela anterior fez Regina Duarte clamar pelo acaricida para salvar suas laranjas destruindo 30 anos de conscientização. Agora na novela “Velho Chico” apelidou de “Sintropia” a energia da agricultura com evolução e harmonia dos seres vivos, com o fim de elitizar o consumo de orgânicos e abrir espaço às tecnologias agroecológicas das grandes corporações. Ela está 40 anos atrasada, pois a energia viva da “Terra Preta da Amazônia” ou dos Alimentos das Populações Tradicionais jamais poderá estar nas mãos da indústria de alimentos e seus agronegócios. Elas estão acima do mercado, pois carregam cultura e valores da identidade de povos que hoje lutam por seu respeito nacional. Os meios de comunicação concessão constitucional precisam ser educados. Uma lastima que não estivessem no Seminário.

Obrigado a todos da “Licenciatura do Campo”, em especial ao amigo Prof. Dr. Antonio Cláudio por abrir este espaço ultrassocial dentro da Universidade e mostrar a cara do Brasil como o fez Darcy e Gerda Ribeiro e muitos outros. Voltei para casa 2 Katuns mais jovem e pronto para mais rebeldia e “subversão” apesar do massacre dos maestros em Oaxaca, criada por Deus seguiremos e seguiremos como Zapata.

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