e, resumo do I Seminário Internacional sobre Educação do Campo
por Tião Pinheiro (Juquira Candiru Satiagraha)
Cambada (não se
ofendam, essa palavra do Quimbundo significa “grupo de camaradas em ação”)
estou de volta do I Seminário Internacional sobre Educação do Campo organizado
pela FACED da U. F. de Uberlândia e muitíssimo mais enfezado (infenso) pelo
massacre de professores em Oaxaca a maior universidade a céu aberto do Planeta.
Uma estudante yankee estudante no M.I.T me disse: “Seis meses nessas montanhas
com esses povos se aprende mais que em cinco anos na minha instituição. Não
entendi por que ela disse povos no plural, mas depois conheci Monte Alban, S.
Juan Tabá, Gelatao em várias viagens a Oaxaca, e então, entendi.
No III Fórum Social
Mundial de Porto Alegre assisti uma oficina organizada por gente da Bunge, que
pôs à mesa 10 ambientalistas famosos para falar sobre o meio ambiente para
respaldar sua ação destruidora social e ambiental no sul do Piauí. Fiz eles
engolirem tudo que tinham dito. Eu estava tão revoltado que ao voltar para o
meu lugar cruzei olhar com um participante vestindo huipil (A. Gonzalez).
Perguntei: Sos mexicano? Ele assentiu com a cabeça e eu ampliei: De donde?
- Ele disse de Oaxaca. Eu disse: Sos feliz, pues Dios hizo Oaxaca y el diablo
hizo el resto del mundo, de donde viven esos. Ele apenas balançou a cabeça. Um
massacre de professores no país que em 1936 deu exemplo ao mundo recebendo
milhares de crianças refugiadas da Guerra Civil Española e foram hospedadas no
Palácio Presidencial em Los Pinos para a perplexidade do Mundo. A Inglaterra
foge da União por temer refugiados e esse massacre nivela governos, mas jamais
nivelará povos. O triste é que não vemos uma campanha orquestrada “Je suis
Oaxaca”. Mundo estranho.
No avião retornando
de Uberlândia comecei a escrever as experiências, emoções e situações no
Seminário. Veio a lembrança do ocorrido na comunidade de Rincón-í, no Paraguai
onde um genocídio foi perpetrado pela Delta Pine através de um agrônomo
norte-americano. Eles venderam sementes de algodão sem poder germinativo para
agricultores paraguaios plantarem em uma falcatrua milionária ganhando nas duas
pontas, pois as sementes tratadas com 5 agrotóxicos e uma bactéria Bacillus
subtilis patenteada (OGM?) para sua disposição legal nos EUA custaria alguns
milhares de dólares.
Os agricultores
indignados devolveram as sementes e a empresa transportou 17 cargas de
caminhões grandes para depositar as sementes envenenadas, clandestinamente em
um terreno baldio perto de uma escola onde estudavam 276 crianças. Fui chamado
a ajudar no problema, mas cheguei à Rincón-í com dor de garganta pelo frio do
avião e sai cedo para procurar folhas de tansagem (Plantago major). Estava eu
prospectando umas macegas e um menino paraguaio com fortes traços do povo
guarani se aproximou e perguntou qual era minha preocupação. Foi obrigado a
repetir em espanhol para receber a minha resposta: Yo necesito una ojita de
llantén (tansagem) para mi garganta.
Ele riu e disse:
Tansagem não nasce em solo argiloso como esse, ele gosta de terra arenosa. Ele
rapidamente procurou na macega e trouxe uma planta parecida a uma malva e disse
pode mastigar essa e deixar junto à gengiva faz o mesmo efeito.
Atônito eu
perguntei a ele como é que você sabe isso. Ele riu e respondeu: Que eu saiba
não é estranho, mas que você não saiba isto sim é muito estranho, e riu...
Com essas lembranças
e referencias posso situar o que significou o Seminário em Uberlândia, mas
antes de chegar a ele é preciso ressaltar 3 elementos fundamentais:
- A Ousadia de
organizá-lo no coração do Portal do Cerrado onde há mais de 35 anos está
montado o maior laboratório de tecnologias para o Bioma que estranhamente não
consta da Constituição Nacional, embora isso tenha outro significado que o de
esquecimento ou ignorância. Laboratório, pois ele não visa atender aquele
Bioma, mas poder aprender nele o que vai se multiplicar na Savana Africana, seu
homônimo vinte vezes maior, na Revolução Verde de matriz Biotecnológica onde
tem interesses Bill Gates e trabalha Kofi Anan.
A mesa de abertura
foi tão ampla que coube a representação de todos os movimentos humanos
ultrassociais, ou seja, aqueles encarregados de alimentar ou proteger a
natureza e a carga de sentimentos e emoções das falas iniciais marcou o segundo
elemento: - O Medo-desespero que ameaça agora mais que antes suas existências.
O terceiro elemento foi à voz de cada movimento sem acesso à educação ou com
ela negligenciado pelo Estado e Governos: Povos Indígenas, Povo Negro -
Quilombola e os Sem Terra e outros que formam o Brasil.
Reforço isso, pois
nos meios de comunicação diuturnamente anuncia-se que os agronegócios são o
responsável pela alimentação da população do planeta. Ignoram que do total de
natureza do Planeta somente 13% é aproveitável, onde a posse da terra está de
60 a 70% nas mãos da indústria de alimentos através dos agronegócios e alimenta
apenas menos de 40% da população do Globo.
Os camponeses do
mundo, segundo o ETC e GRAIN, ocupam de 30 a 35% das terras mas alimentam mais
de 40% daquela população. É óbvio que governos e economias periféricas são
impedidas de medidas para proteger seus camponeses e populações tradicionais
com políticas públicas nacionais, a exemplo do que ocorre com os países
centrais de economia hegemônica. Não interesse na produção camponesa, pois ela
não permite a concentração e escala de commodities sem controle ou ingerências,
também nas propinas e subornos por Coca Cola, Nestlé, Cargill, Bunge, Louis
Dreyfuss etc., que pode ser encontrado no livro “A Máfia dos Alimentos” da
Juquira Candiru.
As populações
tradicionais trouxeram ao I Seminário Internacional de Educação do Campo algo
mais que sua produção de qualidade superior. Trouxeram algo que jamais a
indústria de alimentos e seu agronegócios vão construir: Cultura e Felicidade.
Está foi a produção cientifica apresentada pelos estudantes, acadêmicos e
professores ali presentes.
Um professor baiano
da Licenciatura em Educação do Campo (música popular), da UF do Tocantis
(campus Arraias) com sua harmônica de 8 baixos (gaita ponto do gaúcho), já
praticamente extinta naquela região, nos trouxe algumas letras de Coco e
Emboladas de letras capciosas e um cordel de rara beleza que já os jovens
praticamente desconhecem pelo poder esterilizador dos meios de comunicação e
mídia internacional. Ele chegou a formar uma “camerata” com o duo de chileno e
gaúcho que com quenacho, charango, guitara e violão reviveram as canções
nascidas das comunidades camponesas no que nós hoje denominamos Folclore, mas
bem diferente do mesmo de interesse mercadológico das gravadoras e dos meios de
comunicação e mídia encarregados da alienação cidadã, que não mais trazer a
felicidade do canto na colheita, que significava fartura, felicidade e
harmonia. Eles abriam e encerravam as jornadas do evento.
De certa feita, no
México um camponês me disse: Antes, embora fossemos mais pobres, éramos muito
mais alegres e felizes. Sim perdemos o valor das coisas pelo preço para
conseguir o consumo e o choro substitui o canto e o que se expande é a pobreza,
miséria e degradação cultural, ética e moral.
Eu não podia estar
simultaneamente em todas as mesas que eram mais de 20, mas o que pude assistir
é de registrar-se O desespero de Maximino um representante do Povo Kaiowá que
nos trouxe o desespero da expansão dos agronegócios sobre suas terras e mostrou
em vídeo um assassinato por jagunços onde a vítima baleada e indefesa foi junto
com sua motocicleta atropelado por uma pá carregadeira e arremessado em uma
vala para não existir sequer chance de atendimento. Seria muito propicio uma
operação similar à “Lava a Jato” para as populações tradicionais.
A mesa do movimento
indígena foi transbordante a educação para a vida. No Paraguai há a Associação
de Professores e Maestros que tem o lema: “Quisiera vivir para estudiar y no
estudiar para viver”. O estado de inversão de valores nos leva a Nietzsche na
“Transvaloração de todos os Valores” e com isso se pode entender as colocações
de Dr. (USP) Daniel Munduruku do povo Mundurucu o a Filosofa (UNESP) Cristine
Katua do povo guarani e o oficial aviador da aeronáutica (RE) Marcos Terena do
povo que lhe dá o sobrenome.
A Secretaria de
Saúde do governo de Minas Gerais, uma negra nos trouxe em poucos vinte minutos
uma viagem à condição do negro e sua expulsão do espaço público e privado no
Brasil e suas conquistas a ferro e fogo dia a dia. Ela podia ser considerada o
ponto alto, mas um jovem estudante moçambicano roubou à cena com seu depoimento
humilde, humano e cósmico. Lembrei o amigo Lutzenberger (RIP) que ensinava:
“Tião na África o nativo negro é o equivalente aos nossos povos indígenas, não
há diferença”. Rimos juntos, quando a mulher Tuíra Kaiapó passou lentamente o
facão na cara do burocrata não ameaçadora como a Globo forjou, mas com o
sentido educativo que Maximino nos ensinou a todos (foto). Estou escrevendo
agora e já sei sem aparecer na TV que o Professor Maximino carregou a Tocha
Olímpica para o gáudio não só dos Kaiowas nesse momento de tanta tensão,
desespero e dor.
Minha singela
contribuição foi fazer durante minha apresentação um cromatograma de Pfeiffer
com “Terra Preta de Índio”, o Solo mais fértil do mundo criado pela mão humana.
Não estranhei quando ele se revelou em apenas vinte minutos depois da secagem,
quando o normal são 4 dias. A Rede Globo em uma novela anterior fez Regina
Duarte clamar pelo acaricida para salvar suas laranjas destruindo 30 anos de
conscientização. Agora na novela “Velho Chico” apelidou de “Sintropia” a
energia da agricultura com evolução e harmonia dos seres vivos, com o fim de
elitizar o consumo de orgânicos e abrir espaço às tecnologias agroecológicas
das grandes corporações. Ela está 40 anos atrasada, pois a energia viva da
“Terra Preta da Amazônia” ou dos Alimentos das Populações Tradicionais jamais
poderá estar nas mãos da indústria de alimentos e seus agronegócios. Elas estão
acima do mercado, pois carregam cultura e valores da identidade de povos que hoje
lutam por seu respeito nacional. Os meios de comunicação concessão
constitucional precisam ser educados. Uma lastima que não estivessem no
Seminário.
Obrigado a todos da
“Licenciatura do Campo”, em especial ao amigo Prof. Dr. Antonio Cláudio por
abrir este espaço ultrassocial dentro da Universidade e mostrar a cara do
Brasil como o fez Darcy e Gerda Ribeiro e muitos outros. Voltei para casa 2
Katuns mais jovem e pronto para mais rebeldia e “subversão” apesar do massacre
dos maestros em Oaxaca, criada por Deus seguiremos e seguiremos como Zapata.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
"no artigo 5º, inciso IV da Carta da República: 'é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato'."