por Sebastião Pinheiro
dio “El Mundo” de Buenos
Aires e assim se tornou bilíngue já na pré-escola com os amiguinhos argentinos,
paraguaios e uruguaios.
No
primeiro ano do fundamental foi apelidado de “Zangado” em alusão ao anão da
Branca de Neves, ao que respondia: “Aculturados”, com o cenho franzido,
causando espanto na atônita primeira professora. Ao sorriso da mesma respondeu
com voz suficientemente lenta: Eles têm sua “fadinha do dente” e estão querendo
antecipar a visita dela.
Era
bom aluno, contido, sem ser intrometido ou saliente. Contudo, respondia a
qualquer provocação de forma direta. Em uma visita no “Dia das Crianças” ao
“Orfanato Pão dos Pobres” foi argüido pela estagiária de pedagogia que
auxiliava a professora. Sarcástica ela perguntou: - Já pensou, se você vivesse
aqui?
Sem
pestanejar ou sorrir respondeu: - Para os judeus, Moisés é a criança que
descobre sua origem e determina o fim do cativeiro e início do fim do Império
Egípcio; Para os católicos “os filhos de Saladino” eram as crianças da resposta
árabe aos Cruzados estupradores, seus pais. Na primeira fileira ansiavam o
acertos de contas. Já entre nós na Santa Casa de Misericórdia havia a “Roda dos
Expostos”, onde a Igreja solucionava a imoralidade dos ricos e punia as
mulheres (e crianças). Em nada diferente da odisseia de Oliver Twist
imortalizada por Charles Dickens. A história do “Pão dos Pobres” está ligada à
introdução do capitalismo mundializado na América Meridional através da Guerra
do Paraguai. Hoje, obras como essa são anacrônicas e sobrevivem da benevolência
cidadã, pois em nossa realidade “globalizada” o que interessa ao mercado são as
instituições para menores infratores que aumentaram em dez mil vezes nos
últimos cinquenta anos e servem como instrumento de eugenia mercantil através
do discurso da violência estrutural. Eu aqui seria mais um mero produto, como
os da Serra da Barriga, Serra de Cansanção e vales de Canudos, onde após a
guerra as crianças do sexo feminino foram entregues em prostíbulos de Entre
Rios e adjacências.
Ao
terminar ele olhou profundamente para o distintivo partidário da estagiária.
Ela estava admirada, mais que isso estava embasbacada. Então ele arrematou: Nas
universidades norte-americanas há o ingresso de mais de 600 crianças com a
minha idade estudando e participando em projetos militares, enquanto que na
Universidade de La Plata, 67 crianças com um pouco mais que minha idade foram
mortas pelo governo por serem perigosos para o Estado. Ainda bem, que o livro
“A República de Platão” não vigora, pois as crianças da mesma idade seriam
irmãs e teríamos um genocídio naquele país. Desculpe minha sinceridade, mas se
você vivesse aqui, jamais seria estagiária de uma universidade ainda pública,
nem como “cota mitigatória”. E se por uma casualidade fosse essa exceção, seria
enaltecida aos quatro ventos por ter superado e vencido as dificuldades e dona
de grandes méritos, exemplo a ser seguido para respaldar e justificar o modelo
vigente. É assim que a elite se reproduz, regenera e rejuvenesce. A senhorita
de qualquer forma estaria no mercado, como mercadoria.
A professora aproximou-se sorridente: Soube que
encomendastes na marcenaria um tabuleiro para jogar damas em tamanho grande.
Ele a olhou com respeito e atenção. - É, eu ganhei as peças oficiais, mas tinha
um tabuleiro pequeno e como agora estou estudando as respostas de Alekhine à
defesa Siciliana de Capablanca, pois já terminei a leitura do livro pela
terceira vez” encomendei o tabuleiro para melhor visão do jogo...”
Este
texto introdução não é nada esportivo ou futebolístico, nem lembra Nelson
Rodrigues que nos separou todos em “Arquibaldos” e “Geraldinos” (freqüentadores
de arquibancadas e gerais nos estádios). O texto, é sobre a “violência
estrutural”, estigma ideológico sobre a principal vítima: a cultura popular
nacional, pois somos antes de mais nada, todos, torcedores, por índole,
pacíficos, cordiais e alegres, por isso todos saímos as ruas em junho passado,
mas nem toda a sociedade é juventude. O poder sabe fazer infiltrações,
manipulações e conduções, pois nutre a trilogia de cobiça - ódio – ignorância,
então as imagens nuas e cruas do jogo, Atlético PR e Vasco da Gama
transbordaram em “sucesso”.
A
duas décadas dos EUA vinham na TV a cabo cenas com o mesmo nível de selvageria
(UFC, Bellatur, MMA) segmento desportivo bilionário (patrocínio, prêmios,
divulgação).
Não
deve ser percebido que a “violência estrutural” é imposta para disfarçar a
violência econômica sobre os direitos dos cidadãos no Estado de Bem Estar
Social em decadência programada, onde a trilogia cobiça – ódio - ignorância
estimulam jovens e familiares como as antigas turmas de bairros (patotas,
piquetes etc.) em uma “tribalização” orquestrada onde o crime organizado
extraía a renovação de quadros.
A
“Mara Trucha” em Los Angeles, espólio da Guerra Civil em El Salvador e
similares nas periferias de Paris ou Londres não permitem hipocrisias sobre o
potencial de estímulo sobre as torcidas de futebol para extravasar cobiça –
ódio - ignorância a espera do convite “sorte grande” das Lutas ou Máfias que as
TV e filmes mostram. Afinal qual foi a saída dos chineses para a imposição do
consumo de ópio misturado ao tabaco para aumentar a dependência e lucros: As
artes marciais pelo agregado de cultura à trilogia anterior. Então os
britânicos, franceses e norte-americanos,, japoneses, italianos, alemães
fizeram duas guerras e dividiram a China como uma pizza (foto). Por favor,
neguem que aquelas imagens (do jogo) não eram triviais nas delegacias,
presídios, quartéis (e até antessala de júri) na recepção e tratamento sistemático
dos detidos acusados de subversão.
De
Nelson Rodrigues, que teve filhos encarcerados tomamos a máxima:
“Subdesenvolvimento é coisa séria. É uma obra de séculos”. O alicerce
fundamental do que o capitalismo mundial chama de “subdesenvolvimento” está na
pusilanimidade dos ocupantes das “cadeiras eletivas” (ou cativas). La
Pasionaria (I.D. Ibarruri Gomez) tenía razón. ¡Ellos no pasaron antes y no
pasarán ahora!