Sem dúvida foi uma grande honra para o professor Sebastião Pinheiro receber o convite da professora Ana Primavesi para escrever o prefácio de atualização de seu livro, Manejo Ecológico de Pastagens em regiões Tropicais e Subtropicais recém laçado pela editora Expressão Popular. (acesso aqui). Li o livro quando me encontrava como Técnico de Desenvolvimento Agrário II (INCRA/FEPAF/MST), Assentamento Pirituba II (Itaberá/Itapeva - 2007/2009) e coordenei a parte técnica da pecuária familiar ecológica aplicando na prática o livro da Ana. Um laticínio em mãos dos camponeses voltou a funcionar...
Adquiram o livro, leia. É fonte de água limpa e cristalina; é vida; paixão pelo solo e pelos seus semelhantes. Um lindo auto-reconhecer de maestros nos enchendo de esperança para seguirmos firmes na luta. O.Blanco
Adquiram o livro, leia. É fonte de água limpa e cristalina; é vida; paixão pelo solo e pelos seus semelhantes. Um lindo auto-reconhecer de maestros nos enchendo de esperança para seguirmos firmes na luta. O.Blanco
Prefácio
Ao ser convidado para este prefácio me faltou chão de tão
lisonjeado. Refleti, não exagero, aceitá-lo é quase um sacrilégio pelo
respeito, carinho e grande admiração que a Professora Ana Primavesi merece de
toda a juventude brasileira, latino-americana e mundial. Foi o que me faz
aceitar o desafio e desejar longa vida ao nosso máximo Totem Agroecológico de
saber e serenidade. Fiz um rascunho cheio de medo com enfoque truncado e
enviei. Ele voltou com algumas recomendações, assim encontrei o foco.
Ao começar a ler este livro perceberás que ele não é um livro técnico, é muito mais que isso: Ele é um livro de amor e poesia e trata de algo há muito entre nós está adormecido, o respeito aos animais em sua dignidade. Esse é o rasgo máximo camponês em sua virtude, a humildade. Dignidade que ultrapassa a vida no interior do solo e alcança os microrganismos tão igualmente vilipendiados ou, agora tratados de forma utilitária como peças de montagem. Propositalmente lembro da consigna dos anos 1960 do século passado: Enrijecer-se, sempre sem perder a ternura jamais. É assim que foco o compromisso consciente na restauração da vocação ultrassocial, ou seja, a produção de alimentos para a humanidade como sujeito, em um mundo transformado pela arrogância & prepotência mercantil.
O que é a agricultura? Agir (agri) + cultura. Minha gente ela é tudo. Logo esse livro é mais que poesia e amor é um tratado de ética e moral para as condições de produção do alimento para a pecuária.
Há um outro livro, que todos conhecemos, “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, que nos traz o humano e a terra da Caatinga, vais encontrar nas páginas deste livro reflexões sobre a Terra e o Homem, duas das três partes daquele como valores acima referidos e em todos os biomas nacionais e latinoamericanos.
Necessito me apresentar para enfocar: Estudei em uma Escola Técnica de Agricultura onde tomei conhecimento dos usos de 2,4-D e 2,4,5-T para controlar a resiliência da Mata Atlântica e Cerrado, no Instituto de Pesquisas da Lavoura Cafeeira – IBEC, em Matão do grupo Rockefeller e acompanhei em Sertãozinho/SP outras “pesquisas científicas” com Diethilstylbestrol, hormônio para acúmulo de água e gordura nos animais, hoje ambos bastante conhecidos do ponto de vista trágico por seus danos à saúde e meio ambiente. Era a ideologia em um momento muito parecido ao atual, e para evitar pobres nos cursos elitizados de agronomia foi feita a “Lei do Boi” Nº 5.465, de 3 de julho de 1968, que assegurava reserva de vagas tanto no ensino médio quanto em instituições superiores para beneficiar os interesses da Revolução Verde.
Antes do AI-5 de 13 de dezembro de 1968 saí do país procurando uma escola onde pudesse continuar a estudar duas coisas de meu interesse os malefícios dos venenos na agricultura e a microbiologia, base da vida no solo da natureza emprestado à fração ultrassocial dos seres vivos para o exercício da agricultura.
Querem saber como conheci esta joia que tens em mãos? Foi na Universidad Nacional de La Plata (UNLP) percebi e entendi a disputa acirrada nas universidades e agricultura argentina, na época uma das mais ricas e organizadas no mundo, pelo território (espaço natural e tecnológico) nacional contra as corporações internacionais de desterritorialização. Ali, depois de uma aula complexa sobre manejo ecológico da Matéria Orgânica no Solo no bioma Pampa fomos ao Prof. Molfino e em ato de ousadia perguntei: “A Biocenose do Solo” do matrimônio Arthur e Ana Primavesi é um bom caminho?” Ele, uma vítima da poliomielite em grau severo e apoiado nas muletas postou as mãos ao peito e olhando aos céus foi profético: “Arthur e Ana Primavesi da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) são biodinâmicos”. “Eles estão cem anos adiante e não são o caminho, mas a esperança…” O colega Mastroberti e eu ficamos atônitos. Corremos à biblioteca para ver o que era Biodinâmica e quem eram seus autores. Corria o ano de 1970 de muito fascismo e alienação no Brasil, convulsão na Argentina e Guerra do Vietnã. Eles já tinham um trabalho científico comprovando a predisposição da brusone do arroz pelo nível elevado de Nitrogênio aplicado ao cultivo, que consta no livro de Francis Chaboussou.
Ali estava o livro que relemos “A Biocenose do Solo” e alguns estudantes argentinos por sua identidade nacional de então, pecuária extensiva, e, intensiva pelo tipo de bioma onde o humano era o sujeito cultural denominado gaúcho se desenvolvia desde a Patagônia até o Chaco de Formosa, quase uma caatinga pelo vinhal (Prosopis ruscifolia) passando por todo o Pampa úmido. Eles queriam que fizéssemos sua tradução, mas era um trabalho hercúleo à época pela nossa inexperiência e sobre ocupação com as aulas. É isso, lemos o “Manejo Ecológico das Pastagens” no embrião com uma antecedência de 30 anos.
Então soubemos: O livro “A Biocenose do Solo” havia sido destruído (publicamente) em Santa Maria/RS logo após sua publicação em 1964 pela ditadura instalada. Um livro técnico, eminentemente técnico, de altíssima qualidade e necessidade para o humano no Sertão, Pantanal, Cerrado, Veredas, Campos de Cima da Serra era queimado como em 1933 na Alemanha, por interesses mercantis corruptos.
A questão é que o golpe de 1964 necessitava instalar o modelo de agricultura e pecuária de capital, que eu vivenciara já na Escola Técnica de Agricultura em São Paulo. Com uso excessivo de calcário (Operação Tatú): 20 toneladas/hectare para destruir todo o germoplasma criado por Azzi e Iwar Beckman na década de 30 que permitia o cultivo do trigo com um manejo ecológico em terras ácidas, algo único no mundo. Aquelas sementes eram inconvenientes ao interesse do CIMMYT do Grupo Rockefeller e Council on Foreign Relations pelo que vinha sendo feito nos Vales de Yaquí e Mayo, no México desde 1930. E o território excessivamente calcariado era ideal para o desenvolvimento da soja “do cedo”, que impedia o cultivo do trigo em sucessão. Identicamente o ocorrido no nordeste com o algodão arbóreo, que impedia a cadeia mercantil (moderna) que o algodão herbáceo impunha e destruía a organização camponesa com a desterritorialização estratégica.
Os professores Arthur e Ana Primavesi com visão cultural do território, questão agrária e modelo agrícola, eram inconvenientes para aqueles propósitos das grandes corporações e foram perseguidos na Universidade até serem aposentados da UFSM pelo Ato Institucional Militar, uma ofensa e vergonha nacional, ainda sem reabilitação.
Tudo sobre mineralização, manejo de matéria orgânica, biodiversidade e evolução dos pastos, encontrado neste livro atual, estava embrionariamente em Biocenose. O triste é que nós e o mundo estamos vivendo um “remake” daquele filme agora com o neologismo de agronegócios, que nos remete à terceira parte de “Os Sertões” em um ódio instilado pelo mesmo modelo e ideologia daquela época.
Como dizia o cangaceiro Corisco: “O futuro está em cima do futuro e não em cima do passado”. Voltemos ao futuro, a integração do humano à terra (clima) vai ser deixada de lado e o pesado gibão cultural torna-se obsoleto, pelo poder político do dinheiro de além-mar. Todos os vínculos do “sertanejo” (pecuarista) com o “vazanteiro” (agricultor) das margens do São Francisco, onde nasceu nossa agricultura foram lentamente destruídos e substituídos por cadeias produtivas consolidados nos confinamentos e integrações. O pior confinamento é o de peixe. E o mais pescado no rio São Francisco é a tilápia africana, que consome ração de somente uma única empresa. A integração dos frangos, ovos e suínos socialmente é mais escabrosa. Onde desapareceu a agir (agri)+cultura de poesia e amor. Este livro é música sinfônica restauração e redenção para ouvidos ultrassociais.
Um manejo ecológico de pastagens no Semiárido é o modelo Mocó – Seridó, em pleno sertão com precipitações de 300 mm, com calor extremo, noites frias e ventos constantes e dessecantes. E, mais que isso, ali o algodão arbóreo, milho, macaxeira, abóboras, feijões e grande biodiversidade criam uma paisagem que controla, vento, conserva umidade pelo que é o sistema mais perfeito existente. O Sertão foi o grande produtor de carne, couros, leite através do manejo que estão resgatados nas páginas deste livro. Quando o MST adotou a matriz tecnológica do gado leiteiro houve vibração com a intenção de redenção e integrar o território e sociedade através da pecuária camponesa. Quem se lembra do algodão mocó, o ouro branco do Sertão? O clima varia e os biomas surgem, mas o humano é o mesmo...
Em Chiapas, México onde chove tanto quanto na Amazônia a “milpa maya” tem idêntico manejo e resultados, pois como no Sertão, seu valor está na integração do humano à terra na agri (agir)+cultura e lá a pecuária engloba as aves selvagens, pecarí e cervos que fazem parte do manejo da natureza no sistema.
Na escola agrícola a piada era que o Senador Moura Andrade ao entrar em um espaço dos barões do café, foi ignorado, ao que retrucou: “Amarro um boi em cada pé de café de vocês e ainda me sobram várias boiadas e fazendas repletas.” Era a transformação da pecuária de humano e terra, do sertanejo, pantaneiro, das veredas e do gaúcho pelas pastagens industriais modernas de poder político e econômico desterritorializado, do boi de capital e sua pastagem de insumos, sem sombra, sem natureza em processo de paulatina degradação por ódio e desamor.
Voltemos então ao “Manejo Ecológico de Pastagens”. Sou florestal e sei o que “Range Managment” sobre pastos naturais da Grande Pradeira, terras públicas yankees administradas pelo governo e a importância daquele bioma para EUA, Canadá e México para os grandes rebanhos sagrados dos bisões, quase extinguidos pela cobiça e genocídio. O manejo naquele bioma é feito como consta no livro da Biocenose e melhor ainda em sua evolução. Sobre o massacre dos bisões tive a honra de tocar alguns deles em uma comunidade indígena em Chihuahua no norte do México e outra vez em Alberta no Canadá em uma feira rural. Todos vimos na TV a propaganda ideológica: vocabulário amazônico, maromba...
Usei a palavra sagrado, no início falei de amor e poesia. Uma comunidade de gramíneas, leguminosas e outras no Pampa, Chaco, Cerrado, Savana Africana, “Prairie” ou Desertos de Gobi e Victoria são a expressão do clima em disputa pelo espaço, idem na vegetação arbórea da Caatinga ou Matas e Selvas… Neles os veados-catingueiros, bisões e diversidade de antílopes e parentes é algo que coloca nos seus tamancos as pretensões e arrogâncias incutidas principalmente entre jovens nas universidades, onde não há mais professores como o matrimônio Primavesi. Muito mais que saudade ou nostalgia na perda de valores de cidadania está uma educação para a arrogância e prepotencia servil.
O livro “Manejo Ecológico das Pastagens” serviu no sistema de educação e extensão da Cooperativa Ecológica Coolmeia por sua versatilidade e permitiu durante três décadas ser a organização camponesa mais exitosa no desenvolvimento de tecnologias e modelo para a agroecologia enfocando o humano, a terra, agora englobando “natureza” e “meio ambiente”. Contrariando os interesses internacionais. Hoje se procuram seus conhecimentos por poesia, amor ou espiritualidade somente os jovens estudantes bem postados em sua juventude. Os outros sem saber que agronegócios é um neologismo semanticamente estranho e utilitário, pois é a negação do ócio. A agricultura inexiste na natureza. Ela há mais de 130 milhões de anos é atividade ultrassocial onde uma classe especial com amor, poesia e espiritualidade alimenta a humanidade. A indústria de alimentos considera isso subversão e quer ela ser a produtora de alimentos da humanidade, mas é incapaz de realizar o milagre de transformar o Sol em alimento, com qualidade, pois não trabalha com os principais elementos ultrassociais: cultura, paz e amor.
Para que entendas a poesia no manejo ecológico das pastagens. A equação evolucionária ultrassocial é simples: quando a rainha em um formigueiro morre, ele é extinto; mas em uma colmeia a rainha igualmente põe todos os ovos. Eles são iguais, mas quando as larvas são alimentadas com alimento comum (mel) se desenvolvem operárias estéreis. Quando se percebe a necessidade de substituir a rainha por doença ou morte. Os mesmos ovos alimentados por geleia real desenvolvem rainhas férteis.
A pergunta que está imbricada no livro “Manejo Ecológico de Pastagens” e não quer calar: A rainha poderia colocar alguns “ovos reais especiais” para sua descendência real e não ultrassocial? Contudo a emergência da crise de sua ausência necessita de uma resposta rápida e acorde com a realidade fenotípica da colmeia em linha horizontal e não linha direta vertical, genética, tardia e inútil.
Contra a prepotência e arrogância do agronegócios em todos os ambientes recomendo elevar o nível de conhecimentos, além dos marcos do mercado. - Ácidos hidroxâmicos cíclicos (DIMBOA E DIBOA); o Ciclo de Yang da metionina; isoflavonóides nas Kievitone, Pisatina, Maackianina ou fitoalexinas e resveratrol nas frutíferas e outros frutos de dissecação e esquartejamento. Holisticamente eles estão todos nas entrelinhas preanunciadas pela autora como instrumentos da agroecologia camponesa para a reterritorialização, saúde no solo, nas plantas, nos alimentos e na evolução dos seres vivos muito além do mercado, sejam bisões, cervos, vicunhas ou outros.
A professora Primavesi ensina:
Ao começar a ler este livro perceberás que ele não é um livro técnico, é muito mais que isso: Ele é um livro de amor e poesia e trata de algo há muito entre nós está adormecido, o respeito aos animais em sua dignidade. Esse é o rasgo máximo camponês em sua virtude, a humildade. Dignidade que ultrapassa a vida no interior do solo e alcança os microrganismos tão igualmente vilipendiados ou, agora tratados de forma utilitária como peças de montagem. Propositalmente lembro da consigna dos anos 1960 do século passado: Enrijecer-se, sempre sem perder a ternura jamais. É assim que foco o compromisso consciente na restauração da vocação ultrassocial, ou seja, a produção de alimentos para a humanidade como sujeito, em um mundo transformado pela arrogância & prepotência mercantil.
O que é a agricultura? Agir (agri) + cultura. Minha gente ela é tudo. Logo esse livro é mais que poesia e amor é um tratado de ética e moral para as condições de produção do alimento para a pecuária.
Há um outro livro, que todos conhecemos, “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, que nos traz o humano e a terra da Caatinga, vais encontrar nas páginas deste livro reflexões sobre a Terra e o Homem, duas das três partes daquele como valores acima referidos e em todos os biomas nacionais e latinoamericanos.
Necessito me apresentar para enfocar: Estudei em uma Escola Técnica de Agricultura onde tomei conhecimento dos usos de 2,4-D e 2,4,5-T para controlar a resiliência da Mata Atlântica e Cerrado, no Instituto de Pesquisas da Lavoura Cafeeira – IBEC, em Matão do grupo Rockefeller e acompanhei em Sertãozinho/SP outras “pesquisas científicas” com Diethilstylbestrol, hormônio para acúmulo de água e gordura nos animais, hoje ambos bastante conhecidos do ponto de vista trágico por seus danos à saúde e meio ambiente. Era a ideologia em um momento muito parecido ao atual, e para evitar pobres nos cursos elitizados de agronomia foi feita a “Lei do Boi” Nº 5.465, de 3 de julho de 1968, que assegurava reserva de vagas tanto no ensino médio quanto em instituições superiores para beneficiar os interesses da Revolução Verde.
Antes do AI-5 de 13 de dezembro de 1968 saí do país procurando uma escola onde pudesse continuar a estudar duas coisas de meu interesse os malefícios dos venenos na agricultura e a microbiologia, base da vida no solo da natureza emprestado à fração ultrassocial dos seres vivos para o exercício da agricultura.
Querem saber como conheci esta joia que tens em mãos? Foi na Universidad Nacional de La Plata (UNLP) percebi e entendi a disputa acirrada nas universidades e agricultura argentina, na época uma das mais ricas e organizadas no mundo, pelo território (espaço natural e tecnológico) nacional contra as corporações internacionais de desterritorialização. Ali, depois de uma aula complexa sobre manejo ecológico da Matéria Orgânica no Solo no bioma Pampa fomos ao Prof. Molfino e em ato de ousadia perguntei: “A Biocenose do Solo” do matrimônio Arthur e Ana Primavesi é um bom caminho?” Ele, uma vítima da poliomielite em grau severo e apoiado nas muletas postou as mãos ao peito e olhando aos céus foi profético: “Arthur e Ana Primavesi da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) são biodinâmicos”. “Eles estão cem anos adiante e não são o caminho, mas a esperança…” O colega Mastroberti e eu ficamos atônitos. Corremos à biblioteca para ver o que era Biodinâmica e quem eram seus autores. Corria o ano de 1970 de muito fascismo e alienação no Brasil, convulsão na Argentina e Guerra do Vietnã. Eles já tinham um trabalho científico comprovando a predisposição da brusone do arroz pelo nível elevado de Nitrogênio aplicado ao cultivo, que consta no livro de Francis Chaboussou.
Ali estava o livro que relemos “A Biocenose do Solo” e alguns estudantes argentinos por sua identidade nacional de então, pecuária extensiva, e, intensiva pelo tipo de bioma onde o humano era o sujeito cultural denominado gaúcho se desenvolvia desde a Patagônia até o Chaco de Formosa, quase uma caatinga pelo vinhal (Prosopis ruscifolia) passando por todo o Pampa úmido. Eles queriam que fizéssemos sua tradução, mas era um trabalho hercúleo à época pela nossa inexperiência e sobre ocupação com as aulas. É isso, lemos o “Manejo Ecológico das Pastagens” no embrião com uma antecedência de 30 anos.
Então soubemos: O livro “A Biocenose do Solo” havia sido destruído (publicamente) em Santa Maria/RS logo após sua publicação em 1964 pela ditadura instalada. Um livro técnico, eminentemente técnico, de altíssima qualidade e necessidade para o humano no Sertão, Pantanal, Cerrado, Veredas, Campos de Cima da Serra era queimado como em 1933 na Alemanha, por interesses mercantis corruptos.
A questão é que o golpe de 1964 necessitava instalar o modelo de agricultura e pecuária de capital, que eu vivenciara já na Escola Técnica de Agricultura em São Paulo. Com uso excessivo de calcário (Operação Tatú): 20 toneladas/hectare para destruir todo o germoplasma criado por Azzi e Iwar Beckman na década de 30 que permitia o cultivo do trigo com um manejo ecológico em terras ácidas, algo único no mundo. Aquelas sementes eram inconvenientes ao interesse do CIMMYT do Grupo Rockefeller e Council on Foreign Relations pelo que vinha sendo feito nos Vales de Yaquí e Mayo, no México desde 1930. E o território excessivamente calcariado era ideal para o desenvolvimento da soja “do cedo”, que impedia o cultivo do trigo em sucessão. Identicamente o ocorrido no nordeste com o algodão arbóreo, que impedia a cadeia mercantil (moderna) que o algodão herbáceo impunha e destruía a organização camponesa com a desterritorialização estratégica.
Os professores Arthur e Ana Primavesi com visão cultural do território, questão agrária e modelo agrícola, eram inconvenientes para aqueles propósitos das grandes corporações e foram perseguidos na Universidade até serem aposentados da UFSM pelo Ato Institucional Militar, uma ofensa e vergonha nacional, ainda sem reabilitação.
Tudo sobre mineralização, manejo de matéria orgânica, biodiversidade e evolução dos pastos, encontrado neste livro atual, estava embrionariamente em Biocenose. O triste é que nós e o mundo estamos vivendo um “remake” daquele filme agora com o neologismo de agronegócios, que nos remete à terceira parte de “Os Sertões” em um ódio instilado pelo mesmo modelo e ideologia daquela época.
Como dizia o cangaceiro Corisco: “O futuro está em cima do futuro e não em cima do passado”. Voltemos ao futuro, a integração do humano à terra (clima) vai ser deixada de lado e o pesado gibão cultural torna-se obsoleto, pelo poder político do dinheiro de além-mar. Todos os vínculos do “sertanejo” (pecuarista) com o “vazanteiro” (agricultor) das margens do São Francisco, onde nasceu nossa agricultura foram lentamente destruídos e substituídos por cadeias produtivas consolidados nos confinamentos e integrações. O pior confinamento é o de peixe. E o mais pescado no rio São Francisco é a tilápia africana, que consome ração de somente uma única empresa. A integração dos frangos, ovos e suínos socialmente é mais escabrosa. Onde desapareceu a agir (agri)+cultura de poesia e amor. Este livro é música sinfônica restauração e redenção para ouvidos ultrassociais.
Um manejo ecológico de pastagens no Semiárido é o modelo Mocó – Seridó, em pleno sertão com precipitações de 300 mm, com calor extremo, noites frias e ventos constantes e dessecantes. E, mais que isso, ali o algodão arbóreo, milho, macaxeira, abóboras, feijões e grande biodiversidade criam uma paisagem que controla, vento, conserva umidade pelo que é o sistema mais perfeito existente. O Sertão foi o grande produtor de carne, couros, leite através do manejo que estão resgatados nas páginas deste livro. Quando o MST adotou a matriz tecnológica do gado leiteiro houve vibração com a intenção de redenção e integrar o território e sociedade através da pecuária camponesa. Quem se lembra do algodão mocó, o ouro branco do Sertão? O clima varia e os biomas surgem, mas o humano é o mesmo...
Em Chiapas, México onde chove tanto quanto na Amazônia a “milpa maya” tem idêntico manejo e resultados, pois como no Sertão, seu valor está na integração do humano à terra na agri (agir)+cultura e lá a pecuária engloba as aves selvagens, pecarí e cervos que fazem parte do manejo da natureza no sistema.
Na escola agrícola a piada era que o Senador Moura Andrade ao entrar em um espaço dos barões do café, foi ignorado, ao que retrucou: “Amarro um boi em cada pé de café de vocês e ainda me sobram várias boiadas e fazendas repletas.” Era a transformação da pecuária de humano e terra, do sertanejo, pantaneiro, das veredas e do gaúcho pelas pastagens industriais modernas de poder político e econômico desterritorializado, do boi de capital e sua pastagem de insumos, sem sombra, sem natureza em processo de paulatina degradação por ódio e desamor.
Voltemos então ao “Manejo Ecológico de Pastagens”. Sou florestal e sei o que “Range Managment” sobre pastos naturais da Grande Pradeira, terras públicas yankees administradas pelo governo e a importância daquele bioma para EUA, Canadá e México para os grandes rebanhos sagrados dos bisões, quase extinguidos pela cobiça e genocídio. O manejo naquele bioma é feito como consta no livro da Biocenose e melhor ainda em sua evolução. Sobre o massacre dos bisões tive a honra de tocar alguns deles em uma comunidade indígena em Chihuahua no norte do México e outra vez em Alberta no Canadá em uma feira rural. Todos vimos na TV a propaganda ideológica: vocabulário amazônico, maromba...
Usei a palavra sagrado, no início falei de amor e poesia. Uma comunidade de gramíneas, leguminosas e outras no Pampa, Chaco, Cerrado, Savana Africana, “Prairie” ou Desertos de Gobi e Victoria são a expressão do clima em disputa pelo espaço, idem na vegetação arbórea da Caatinga ou Matas e Selvas… Neles os veados-catingueiros, bisões e diversidade de antílopes e parentes é algo que coloca nos seus tamancos as pretensões e arrogâncias incutidas principalmente entre jovens nas universidades, onde não há mais professores como o matrimônio Primavesi. Muito mais que saudade ou nostalgia na perda de valores de cidadania está uma educação para a arrogância e prepotencia servil.
O livro “Manejo Ecológico das Pastagens” serviu no sistema de educação e extensão da Cooperativa Ecológica Coolmeia por sua versatilidade e permitiu durante três décadas ser a organização camponesa mais exitosa no desenvolvimento de tecnologias e modelo para a agroecologia enfocando o humano, a terra, agora englobando “natureza” e “meio ambiente”. Contrariando os interesses internacionais. Hoje se procuram seus conhecimentos por poesia, amor ou espiritualidade somente os jovens estudantes bem postados em sua juventude. Os outros sem saber que agronegócios é um neologismo semanticamente estranho e utilitário, pois é a negação do ócio. A agricultura inexiste na natureza. Ela há mais de 130 milhões de anos é atividade ultrassocial onde uma classe especial com amor, poesia e espiritualidade alimenta a humanidade. A indústria de alimentos considera isso subversão e quer ela ser a produtora de alimentos da humanidade, mas é incapaz de realizar o milagre de transformar o Sol em alimento, com qualidade, pois não trabalha com os principais elementos ultrassociais: cultura, paz e amor.
Para que entendas a poesia no manejo ecológico das pastagens. A equação evolucionária ultrassocial é simples: quando a rainha em um formigueiro morre, ele é extinto; mas em uma colmeia a rainha igualmente põe todos os ovos. Eles são iguais, mas quando as larvas são alimentadas com alimento comum (mel) se desenvolvem operárias estéreis. Quando se percebe a necessidade de substituir a rainha por doença ou morte. Os mesmos ovos alimentados por geleia real desenvolvem rainhas férteis.
A pergunta que está imbricada no livro “Manejo Ecológico de Pastagens” e não quer calar: A rainha poderia colocar alguns “ovos reais especiais” para sua descendência real e não ultrassocial? Contudo a emergência da crise de sua ausência necessita de uma resposta rápida e acorde com a realidade fenotípica da colmeia em linha horizontal e não linha direta vertical, genética, tardia e inútil.
Contra a prepotência e arrogância do agronegócios em todos os ambientes recomendo elevar o nível de conhecimentos, além dos marcos do mercado. - Ácidos hidroxâmicos cíclicos (DIMBOA E DIBOA); o Ciclo de Yang da metionina; isoflavonóides nas Kievitone, Pisatina, Maackianina ou fitoalexinas e resveratrol nas frutíferas e outros frutos de dissecação e esquartejamento. Holisticamente eles estão todos nas entrelinhas preanunciadas pela autora como instrumentos da agroecologia camponesa para a reterritorialização, saúde no solo, nas plantas, nos alimentos e na evolução dos seres vivos muito além do mercado, sejam bisões, cervos, vicunhas ou outros.
A professora Primavesi ensina:
“O homem
nunca se mostra amigável e quando aparece é somente para vacinar ou matar.
Assim, o gado mais dócil foge e o mais bravo ataca, quando vê um homem. Sempre
existirá um ou outro animal indócil, mas a maioria é dócil quando bem tratada.
Somente se torna um gado nervoso quando deficiente em magnésio e quando
maltratado.”
O
alimento agroecológico supera o “gene drive de biologia sintética”, pois
desenvolve naturalmente a (meta)proteômica dos microrganismos no solo, planta e
alimentos. Amor e carinho são seus complementos.
Finalmente a professora Primavesi lapida:
Finalmente a professora Primavesi lapida:
“O manejo
ecológico das pastagens deve considerar TODOS OS FATORES DE UM LUGAR, uma vez
que “eco” significa lugar. Deve manter o equilíbrio entre o gado adaptado; a
vegetação e sua capacidade de produzir forragem boa neste solo; a influência do
gado sobre a vegetação e da vegetação sobre o gado; os fatores do solo em
consideração à vegetação e ao gado, com sua estrutura, riqueza mineral,
microvida e fauna-terrícola, que inclui as minhocas, bem como a influência do
clima. O manejo é ecológico quando consegue manter em equilíbrio todos os
fatores de um lugar ou restabelecer o equilíbrio favorável entre eles, para que
não haja decadência do ecossistema e para que proporcione as condições melhores
possíveis ao gado. Para isso, necessita-se de muita observação, bom senso,
dedicação e muito amor pelo trabalho. Mas, compensa!”
Sim, magna mestre e torna
possível territorializar novamente a agricultura, sem adjetivos, questão
agrária e a agroecologia como modelo de tecnologia, muito além da etimologia de
agronegócios.
O professor Molfino foi humilde, como dizem os camponeses mexicanos: Muito agradecido por nos ensinar o caminho da luz e esperança para o Futuro.
O professor Molfino foi humilde, como dizem os camponeses mexicanos: Muito agradecido por nos ensinar o caminho da luz e esperança para o Futuro.
Sebastião Pinheiro
O homem é o que a terra, ou o solo, faz dele.
Ana Maria Primavesi
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