Idiossincrasia carioca

28 dezembro 2019

 o Pereba

Em tempo de câmaras eletrônicas por toda parte, antenas e celulares, nem é preciso falar, tudo é oficial ou privativamente filmado, gravado ou registrado. É prática corrente principalmente entre militares (não existem ex-militares) quando se quer falar sobre temas reservados, se marca um encontro e aluga um barco e fica a uma distância segura para evitar microfones hiperbólicos ou gravação binocular por satélite. Não existe lugar melhor para disfarçar uma reunião que pescarias. Melhor ainda em uma área reservada onde não é permitido pescar. O inconveniente é quando aparece um fiscal ambiental e lasca uma multa. Ela é instrumento para qualquer operador de “big data” gerador de algoritmos. O mundo mudou! 

 

É muito comum em todo Brasil se encontrar suboficiais e oficiais das Polícias Militares portando um brevê de paraquedista no lado direito do peito (foto). Isso começou com a reação ao golpe de 1964, quando os militares tinham de estar em todo o território imediatamente pelas dimensões do país. Embora não tenha montanhas possuí selvas impenetráveis e o pessoal das forças públicas eram auxiliar e precisavam treinamento antiguerrilha, ou seja, foram treinados na Brigada de Paraquedistas em Deodoro, na Vila Militar.

Toda capacitação cria “áureas de poder”, fundamentalmente quando é repressora, e o sujeito é transformado em objeto de execução descartável. Daí surge uma palavra que atraí muito os jovens desorientados, rebeldes ou de intelecto rebaixado: “mercenários”, “soldados da fortuna”. Se você não acredita verás que o corpo de maior custo no exército dos países industriais é o de mercenários. Pouco se fala na Legião Espanhola, sediada em Marrocos e Canárias de onde saiu o galego Franco para destruir a República recém criada…

Muito se estudou a Legião Francesa em suas tropelias desde a Córsega por todo o mundo. A leitura do livro “Beau Geste”, do militar britânico Percival Christopher Wren é um bom início. O ato de alto impacto dela foi deixar a 13ª Meia Brigada, para o sacrifício supremo em Dien Bien Phu en 1954 para garantir a retirada de seus camaradas. Eles enfrentaram alguém que será encarregado de derrotar também os EUA no mesmo lugar menos de 20 anos depois o General Vö Nguyen Giáp, tenho um amigo, biólogo alagoano que foi homenageado por seu pai agrônomo com o nome. Ali na famosa Indochina, primeiro ela perde seu chefe, o Ten. Cel.G. B de Sairigné. En Dien Bien Phu morrem todos inclusive seu comandante Ten. Cel Jules Gaucher.

Em Setembro de 2000 no litoral do Senegal havia 12 navios de guerra da OTAN e os paraquedistas franceses estavam no controle do aeroporto de Dakar e de todo o país, pela “Guerra dos Diamantes de Sangue, em Serra Leoa”. O hotel onde eu estava foi ocupado pelos “Royal Commanders”, SAS e ali fiquei uma semana vendo o desenrolar da crise em Serra Leoa. Pobre África!

Voltemos à realidade dos tempos da ditadura e medo de uma invasão cubana na Amazônia. O convívio na incerteza cria vínculos de dependência de alto impacto psíquico, o que exige um treinamento sério, que não é fácil forjar no soldado ignorante, ainda quando seu oficial e suboficial são treinados em escolas mais preocupados com usufruto do poder, e não servir ao poder nacional.

Durante a campanha eleitoral, um candidato disse: O negro e o índio são indolentes etc. etc. É triste ver esse estereotipo grosseiro. Seu irmão em armas, alemão Paul Emil von Lettow-Vorbeck, comandando poucos “Askaris” (negro retintos) durante a primeira guerra mundial derrotou tropas inglesas, portuguesas, francesas e italianas muitas vezes melhor equipadas e em número, por uma razão muito simples, sua alma mater era o Ginásio Francês de Berlim e sua formação era muito parecida a de Nyugen Giáp, professor de literatura, pois todos seus soldados deles foram alfabetizados e treinados para saber o valor da liberdade e pátria, mesmo em situação colonial. É verdade quem segue algoritmos externa o que a fração objetivo quer escutar e o mundo perde qualidade. Brasil!

Os vínculos de amizade e relações entre treinadores e treinados, nestas condições seguem a recomendação de Hemingway: “É mais importante conhecer quem está ao leu lado na trincheira do que contra quem combates.”

Todos os corpos de paraquedistas no mundo possuem rituais secretos, pois sua sobrevivência depende mais do seus companheiros que de si mesmo e esta confiança é tão íntima que extrapola qualquer outra. 

 

O combate à "subversão" era tão assimétrico e repressor que a grande maioria dos treinadores e treinados, sem perspectivas e superdimensionando sua posição como “comandos” de decisão, que desenvolveram traumas psíquicos ou doenças sociais (Sozial Krankenheit) com um superego. Ainda mais quando a ditadura era o exercício físico para o militar frustrado por não poder usar os instrumentos para o qual era treinado e vê-los ser substituídos sem haver sido estreados. É preciso muito autocontrole.

A falta de controle é política relaxada ou concessão para não o repressor não esmorecer.

Onde existem guerras, revoluções o caminho é o o contrato como "soldado da fortuna". Quando não há o mercado externo, que exige qualidade no padrão Delta, SAS ,o negócio é ficar em casa.

Desde a época do A.I. - 5 soldados oficiais com brevê passaram a complementar o salário como segurança do jogo do bicho (Capitão Guimarães), uma contravenção, no país onde ser "doleiro" é ser empresário investidor, quando ele é um criminoso contra a economia nacional, dali a formação de milícias privadas para atender comerciantes, industriais e outros progrediu. Já no governo Brizola no RJ isso era vigente no boca a boca dos agrônomos no Rio de Janeiro. Nós nem sabemos as empresas gigantes que atuam no Iraque, Afeganistão, como a Blackwaters e a Halliburton, ou grupos como “Academi”, “G4S”. O Brasil é um lugar de “pé de chinelo” e não tem mercado para mercenário deste nível e envergadura. As vezes vemos um “encardido” (mestiço que se crê branco) pertencendo a uma organização de netos de italianos fascistas ou neonazi, por falta de lar e escola. 

Hoje é o Dia dos Inocentes, reconhecido pela igreja católica, quando os “soldados” de Herodes mataram todas as crianças nascidas desde dois anos anteriores até aquele momento, pelo nascimento do menino Jesus Cristo. Soldados das Nações Unidas europeus e latino americanos trocam sexo por água e biscoitos com crianças de sete anos na África e Haíti. Em nada diferente da pedofilia sacerdotal... Mendoza é uma esperança mundial.

O raro é que em muitos países de colonização espanhola se use o dia não para a reflexão sobre o que o poder faz pelo medo, mas se faz troça e gozação muito parecida com o Primeiro de Abril.

Se você não entendeu, por favor sou obrigado a ser pedante e recomendar “The King Soldier”, de Violette Malan para saber o que é o significado da "Irmandade de Comandos" e o que aconteceu com o general Petraeus, que tinha Ph. D em ciências sociais (foto).  

O resto é o resultado dos programas da TV Globo e outras e da idiossincrasia carioca, nosso grande laboratório social, onde tudo acontece 30 anos antes.